sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Sono de Boneca

A menina monta sua casa de bonecas com um esmero exemplar. Tem as mãos gigantescas diante das dimensões daquela casa. Talvez seja dessa desproporção que nasça todo o cuidado que a gente vê. Quando se tem as mãos em dimensões diferentes dos objetos manipulados é preciso ter cuidado dobrado, não se quer nada quebrado ou fora do lugar. As cores são claras, límpidas. Talvez numa quase inútil esperança de que o sono será mais tranquilo, afinal de contas, o sono das bonecas é leve, e a confusão é satisfatória. Sono de boneca é algo perigoso, porque qualquer pensamento no meio da noite, por mais vão que seja, é capaz de ser transformado em uma das mais profundas ilusões. A boneca faz parte de um mundo de ilusão, onde aquela aparente felicidade reina em meio a pompas. E agarrar a primeira ilusão passante não seria algo a se estranhar, a realidade da boneca é a ilusão. Isso não se discute, a partir de agora é real.

Escolhem suas cortinas e tapetes, aqueles tipos de coisas que irão esconder a nudez e a sujeira. É preciso se tomar cuidado com aquelas que resolvem esconder sua sujeira e revelar sua nudez. As bonecas são as primeiras a perderem suas roupas, a casa pode até continuar em pé, mas as roupas não. Parece até que o vestuário é parte dispensável da brincadeira, ou melhor, parece até que a roupa impede que se note qual a capacidade de articulação das suas juntas.

Dos vários materiais saem vários tipos de bonecas. Tecendo peles, nas cores e texturas; Tecendo cabelos, nos fios que parecem seguros para se pendurar; Tecendo suas dobras, nas gingas do seu corpo frágil, resistente ao fogo. Há uma variedade de donos, de claustros, as casas das bonecas. Por suas personalidades várias, não sabemos em qual realidade resolverão repousar. Apenas recomenda-se não esquecer da qualidade do seu sono.

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